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A Batalha de Acosta Ñu e o Dia das Crianças

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No paraguai, são prestadas homenagens aos mortos no Día del Niño

Brasil matou mais de cinco mil crianças na Batalha de Acosta Ñu (Foto: Reprodução)

Há alguns anos, tive a oportunidade de estudar a perspectiva paraguaia sobre a Guerra do Paraguai graças aos jornalistas e escritores Hugo Montero e Jaime Galeano, da revista argentina Sudestada. A partir disso, em 2007, escrevi uma história de ficção chamada “Rio de Águas Vermelhas” que foi publicada na época e retrata a história de uma família que foi fazer um piquenique às margens do Rio Nhu-Guaçu, onde todos foram assassinados brutalmente pelo Exército Brasileiro.

Me inspirei em alguns fatos que incluem a Batalha de Acosta Ñu em 1869, episódio jamais esquecido pelos paraguaios. Faço questão de destacar que enquanto no Brasil o Dia das Crianças, celebrado no dia 12 de outubro, se resume a fazer algo de bom pelos pequenos, como dar presentes ou levá-los para se divertir em algum lugar, no Paraguai a realidade é bem diferente. O Día del Niño, em 16 de agosto, é marcado por muitas homenagens aos que foram mortos na Batalha de Acosta Ñu,  em Eusebio Ayala, no Departamento de Cordillera, onde a maior parte da força paraguaia era formada por garotinhos segurando varas de madeira que simulavam rifles.

Em suma, foi um conflito desigual, pois Uruguai, Argentina e Brasil não contavam apenas com número superior de soldados, mas também mercenários que faziam as rajadas de fogo cortarem o vento. Aos poucos, pilhas de corpos se espalharam pela pradaria conforme a bandeira da Tríplice Aliança assegurava um morticínio sem precedentes numa guerra sul-americana liderada por ingleses.

Na Batalha de Acosta Ñu havia mais de cinco mil crianças entre 9 e 15 anos. Ainda assim, o Conde D’Eu ordenou que os soldados não deixassem vestígios do abate para não precisarem carregar inimigos feridos. No Paraguai, é de conhecimento popular que a verdadeira história da guerra com o Brasil, Uruguai e Argentina foi omitida pelos países da Tríplice Aliança.

Entre 1865 e 1870, a Aliança matou mais de 90% da população masculina paraguaia. Durante a guerra, estima-se que a cada 100 mil homens paraguaios sobreviviam apenas quatro. O episódio representou a perda de quase 61 mil quilômetros quadrados de extensão territorial. Com o fim das beligerâncias, o Paraguai contraiu uma enorme dívida com o banco inglês Baring Brothers, o mesmo que financiou a participação dos países da Tríplice Aliança.

Descendentes de sobreviventes da guerra contam que quando as crianças caíam mortas sobre o solo paraguaio, as mães se juntavam ao grupo com as armas dos filhos falecidos. A realidade era tão caótica que o Marquês de Caxias renunciou ao posto e enviou uma carta para Dom Pedro II. De acordo com o marquês, a megalomania da Tríplice Aliança chegou a um ponto em que a guerra só terminaria quando toda a população do Paraguai fosse transformada em fumaça, quando matassem o último feto no ventre da mulher paraguaia.

Antes de deixar a Batalha de Acosta Ñu, o Conde D’Eu, um dos maiores criminosos de guerra do Brasil e substituto do Marechal Caxias, mandou atear fogo nos últimos feridos e prisioneiros. Eliminaram todos os inimigos que encontraram e levaram consigo apenas os aliados ainda saudáveis.

Um sonho de futebol

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Natal Francisco, o pioneiro que sempre acreditou no futebol local

Fundado em 1946, o Atlético Clube Paranavaí não existia sem o empenho de Natal Francisco (Foto: Reprodução)

Fundado em 1946, o Atlético Clube Paranavaí não existiria sem o empenho de Natal Francisco (Foto: Reprodução)

Há poucos jovens em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, que já ouviram falar em Natal Francisco, o pioneiro a quem o Atlético Clube Paranavaí (ACP) deve muito. Francisco foi o responsável pela construção do primeiro estádio de futebol da cidade, uma conquista altruísta numa época de sonhos coletivos.

O pioneiro paulista Natal Francisco veio para a região Noroeste do Paraná pela primeira vez acompanhado do irmão José Francisco. Saíram de Presidente Prudente, interior de São Paulo, com a intenção de conhecer a tão falada Fazenda Brasileira, atual Paranavaí. Logo de cara, não acharam o lugar receptivo, então ficaram aqui oito dias e retornaram ao interior paulista. Em 1944, Natal Francisco voltou com a família e fixou residência em Paranavaí.

Apaixonado por futebol, a primeira iniciativa do pioneiro quando se mudou para cá foi conversar com o administrador geral da colônia, Hugo Doubek, sobre a possibilidade de conseguir um terreno para a criação de um campo de futebol. “O Hugo autorizou que eu abrisse uma picada até onde achasse melhor, a partir daí um engenheiro iria demarcar a área e entregar o terreno”, explicou o sapateiro Natal Francisco em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.

Francisco escolheu um espaço onde é atualmente a Praça dos Pioneiros. Lá, mediu com os passos uma área de 280 por 200 metros quadrados. “Então fui pra Curitiba conversar com o governador Moisés Lupion. Fiz um requerimento em nome do Atlético Clube Paranavaí (ACP) e falei pra ele que queria o terreno. Mostrei o rascunho do engenheiro com detalhes do campo oficial para os jogos profissionais, um campinho para a rapaziada, uma piscina e a sede”, relatou.

Lupion então concedeu o terreno a Natal Francisco para a construção do primeiro estádio local. Empolgado, o pioneiro fez um acordo com o marceneiro José Ebiner que ajudou fornecendo madeiras a preço de custo. “Também contamos com a ajuda de alguns paraguaios. Eles quem transportavam e escolhiam as melhores peças para fazer as tábuas e as balaustres”, revelou Francisco.

Sapateiro foi o responsável pela construção do primeiro estádio do ACP (Foto: Reprodução)

Todo mundo ajudou na construção

Quando aparecia algum caminhão na colônia, o sapateiro pedia para ajudarem a transportar as toras até a serraria de Ebiner, acelerando o trabalho. “Em troca disso, a gente pagava as despesas do caminhão”, enfatizou o pioneiro, acrescentando que todo mundo participou da construção do estádio.

Sob comando do sapateiro, o campo, que anos mais tarde recebeu o nome de Estádio Municipal Natal Francisco, não demorou para ficar pronto. O próprio pioneiro cercou o campo com balaustres e construiu a sede quando não estava trabalhando na sapataria que tinha na esquina da Rua Getúlio Vargas com a Rua Minas Gerais.

Pela construção do estádio, o sapateiro apaixonado por futebol e por Paranavaí desde os tempos de Fazenda Brasileira nunca recebeu nada, a não ser a satisfação de admirar a sua criação e também ver a alegria de tantas pessoas que tinham como único lazer os jogos do Atlético Clube Paranavaí (ACP).

“Quantos não riram e choraram durante os jogos oficiais do ACP naquele estádio que ficava na Praça dos Pioneiros? A gente deve isso ao Natal Francisco, homem que criou um estádio com as próprias mãos, coisa que não existe hoje em dia”, comentou o pioneiro cearense João Mariano que atribui a existência e longevidade do Atlético Paranavaí ao sapateiro.

Muitos pioneiros destacam que o surgimento do primeiro campo oficial de futebol aproximou mais a população e também ajudou a superar os momentos de dificuldade. “Tinha gente que ficava a semana toda na expectativa de assistir a um jogo, isso animava mesmo as pessoas”, assegurou Mariano. Para o pioneiro mineiro José Antonio Gonçalves, Natal Francisco não teve o devido reconhecimento. “Ele foi um homem que deu tanto por Paranavaí. Hoje é praticamente esquecido”, reclamou Gonçalves.

Três mil réis em troca do terreno do estádio

Antes de construir o estádio de futebol na década de 1940, logo após a aquisição do terreno, o sapateiro Natal Francisco foi coagido por um morador local que tinha outros planos para o lugar. “O cara me ofereceu três mil réis em troca do terreno. Eu não aceitei porque já tinha feito a doação ao povo, era uma homenagem a eles. O indivíduo disse que nunca viu um sujeito bobo igual a mim que precisa de dinheiro e não aceita uma boa proposta”, declarou.

Em réplica ao homem, o sapateiro declarou que ganhava o suficiente para o sustento da família e ainda rebateu que a colônia cresceria muito. Irritado, o sujeito se comprometeu a ir até Curitiba fazer o possível para comprar pelo menos metade do terreno. À época, Natal Francisco ficou preocupado e decidiu ir até a capital com o seu Ford 29, movido a gasogênio.

“Meti uma muda de roupa dentro do carrinho e disse pra minha mulher que iria resolver a situação. Cheguei lá num dia pela manhã. Fui ao palácio do governo, mas o guarda não me deixou entrar”, confidenciou o pioneiro que gastou dinheiro do próprio bolso na viagem que durou dias por causa da precariedade das estradas.

Francisco insistiu para que o homem lhe fizesse um favor. “Pedi ao guarda para dizer ao governador que o Natal Francisco, de Paranavaí, precisava muito falar com ele”, lembrou. Dado o recado, sem demora, Moisés Lupion que estava dormindo se levantou e ainda de pijama foi atender o sapateiro. Lupion o convidou para entrar e tomar café. A obstinação do pioneiro chamou a atenção do governador que o qualificou como “um sujeito cem por cento”.

“Falou que se alguém tivesse a capacidade de ir a Curitiba para pegar um palmo daquela terra bastaria entregar a ele o nome da pessoa”, enfatizou. Ao final da conversa, Moisés Lupion afirmou que a terra já era do sapateiro e ainda garantiu a ele que dois dias após aquele encontro o título da terra estaria na colônia. Foi exatamente o que aconteceu.

Saiba Mais

Em 1961, o presidente do Atlético Clube Paranavaí (ACP), Waldemiro Wagner, construiu as arquibancadas do Estádio Natal Francisco e também o cercou com alambrado.

Na década de 1970, o Estádio Municipal Natal Francisco foi transferido para o Sumaré, distrito de Paranavaí.

Frase do pioneiro João da Silva Franco

“A única diversão daqui era o futebol. O campo de futebol foi feito pelo braço do povo”.

Capitão Telmo: herói ou vilão?

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Telmo Ribeiro é um paradoxo na história de Paranavaí, o herói que se transformava em vilão

Ribeiro chegou a Paranavaí em 1936 (Foto: Reprodução)

O capitão Telmo Ribeiro é um dos personagens mais controversos da história de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. Viveu aqui entre os anos de 1936 e 1964. Durante esse período, conquistou amigos, inimigos e apatia.

O tenente

Em 1932, o tenente gaúcho Telmo Ribeiro deixou o Rio Grande do Sul e foi para Porto Murtinho, no Mato Grosso (atual Mato Grosso do Sul), lutar na Revolução Constitucionalista. Com o fim dos conflitos, Ribeiro comandou o regimento de cavalaria de uma brigada militar em Ponta Porã. A missão era defender a fronteira brasileira. “Eu era tenente no esquadrão do Telmo. Naquele tempo, quem comandava a brigada era o coronel Mário Garcia”, relatou o pioneiro mato-grossense Alcides Loureiro de Almeida em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.

Enquanto trabalhou em Ponta Porã, Telmo Ribeiro morou em Bela Vista, na Fazenda Casualidade, de João Loureiro de Almeida, pai de Alcides Loureiro. “Depois de um tempo, a brigada foi extinta e surgiu o convite para trabalhar na Fazenda Caaporã. Contratamos alguns homens e começamos o plantio e transporte de erva-mate para exportação”, lembrou Loureiro. Mais tarde, Telmo e Alcides retornaram a Ponta Porã. Loureiro continuou trabalhando na cidade e Ribeiro fechou um contrato com a Companhia Mate-Laranjeira para transportar erva-mate através do rio em um barco a vapor.

Em uma das viagens pelo estado, Telmo Ribeiro conheceu o engenheiro Francisco Natel de Camargo que atuava como boiadeiro, levando gado vacum do Mato Grosso para a Fazenda Brasileira, futura Paranavaí. A carne bovina alimentaria os migrantes que viviam no povoado. “O Natel levou o Telmo até Londrina para conversar com o representante do governo, o delegado Achilles Pimpão, intermediário do interventor Manoel Ribas”, revelou o pioneiro Alcides Loureiro.

Ao conquistar a simpatia do delegado e do interventor, Telmo Ribeiro foi contratado para abrir estradas ligando a Brasileira ao restante do Paraná. “Lembro quando ele foi encarregado por Natel de Camargo para abrir uma estrada para a movimentação de gado da Brasileira até a Gleba Roland [atual Rolândia]”, pontuou o pioneiro pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles, ex-empregado e amigo do tenente Telmo.

Salles contou que Ribeiro fixou residência onde é atualmente o Jardim São Jorge. Lá, havia uma colônia abandonada, com casas boas e móveis coloniais de finíssima qualidade. “As árvores já tinham varado o teto das residências. Telmo aproveitou o que deu pra aproveitar”, assegurou o pernambucano.

O herói

Em 1936, nas palavras do pioneiro paulista Natal Francisco, o tenente e uma turma de paraguaios acabaram com a onda de assassinatos praticados por grileiros na Fazenda Brasileira. Nessa época, o tenente já se destacava entre a população humilde do povoado. Tinha boa postura e passo firme, mas o que mais chamava atenção era o carisma, o requinte e a elegância. Ribeiro usava paletó de alta qualidade combinando com botas feitas sob medida, além de um cinturão que tinha como fivela a letra T.

Fumava apenas charutos importados da Holanda e só usava perfume francês. “Ele tinha um anel madrepérola feito por um famoso joalheiro carioca. No pescoço, sempre trazia um lenço de cetim preso por um broche de ouro”, detalhou Alcides Loureiro, acrescentando que apesar da fama de violento, Telmo Ribeiro era um homem delicado.

O título de capitão, o tenente gaúcho recebeu por serviços prestados ao Estado do Paraná na Brasileira, segundo o pioneiro paulista Valdomiro Carvalho. Contudo, o pioneiro curitibano Aldo Silva deu outra versão sobre o assunto: “Ele foi promovido a capitão pelo próprio povo da região, então ficou conhecido assim.” Telmo Ribeiro se tornou uma figura tão influente na cidade que a jardineira da Viação Garcia que fazia a linha Paranavaí-Londrina adotou como ponto de parada a casa do capitão.

Ao longo da vida, o pioneiro paulista Salatiel Loureiro nunca se esqueceu de um favor feito por Telmo na década de 1940. “Uma vez, ele foi até Curitiba requerer meu título de terras. Fez isso e não cobrou nada.” Carlos Faber, José Alves de Oliveira, José Ferreira de Araújo (Palhacinho), Severino Colombelli, José Francisco Siqueira (Zé Peão) e Izabel Andreo Machado são alguns pioneiros que sempre tiveram bom relacionamento com o capitão Telmo Ribeiro.

“O meu amigo sempre foi um líder, homem com fibra de pioneiro, com o qual partilhei bons e maus momentos”, destacou Alcides Loureiro. Outro pioneiro que defendia a idoneidade e o caráter de Ribeiro era o paulista João da Silva Franco. “Muita gente falava que ele era ruim e ganancioso. Mas eu acredito que ele nunca matou ninguém. O problema era a cabroeira dele, usavam o nome do Telmo pra fazer coisas erradas aqui”, salientou.

O vilão

Se por um lado, o capitão Telmo Ribeiro foi admirado e fez valiosas amizades nos 28 anos dedicados a Fazenda Brasileira, depois Paranavaí, por outro, também conviveu com pessoas que não aprovavam suas atitudes, não gostavam dele ou lhe eram indiferentes. “Lembro que ele andava com dois revólveres, uns dez capangas e insultava muita gente na rua. Telmo achava que só ele tinha razão”, desabafou o pioneiro cearense Raimundo Leite.

Leite costumava relembrar o episódio em que entrou em conflito com o capitão. “Certo dia, o Raimundo Arruda e o Zé Andrade insultaram ele no Bar do Zé e depois foram pra minha casa. O Telmo apareceu lá e o pau quebrou. Teve gente que apanhou e correu. Eu não tinha nada com o peixe, mas quase sobrou pra mim. A minha sorte foi que chegou um pessoal e pediu pra ele não fazer nada comigo”, enfatizou.

Com o tempo, Ribeiro conquistou muitas inimizades em Paranavaí. “Aqui tinha os capa-preta e me recordo que eles queriam matar o capitão Telmo Ribeiro”, revelou o pioneiro espanhol Thomaz Estrada. Para a pioneira fluminense Palmira Gonçalves Egger, o capitão Telmo perseguiu muita gente e fez muitas coisas que não deveria ter feito.

Capitão Telmo (primeiro da direita para a esquerda) viveu aqui até 1964 (Foto: Reprodução)

De acordo com o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira, Telmo ajudou muito Paranavaí, mas nunca permitiu que alguém se lançasse contra ele na política. “No fundo, era boa pessoa, mas também sabia ser violento quando eram com ele”, avaliou. O pioneiro mineiro Enéias Tirapeli pertencia a um grupo que não simpatizava e nem desgostava de Telmo Ribeiro, apenas era indiferente ao capitão.

“Nunca me relacionei com ele, mas achei errado ele ter matado aquele rapaz na cadeia”, ressaltou, referindo-se ao assassinato do jovem Alcides de Sordi, de quem o capitão assumiu a autoria do crime. Fato sobre o qual houve divergências de opiniões. O pioneiro João Franco dizia que Telmo Ribeiro nunca atirou no rapaz. Para ele, o capitão tinha as “costas quentes” e chamou a responsabilidade para si na tentativa de livrar os amigos da prisão.

A decadência do capitão

Nas décadas de 1940 e 1950, Ribeiro conseguiu status e fortuna em Paranavaí. Entre as suas propriedades estava uma fazenda que compreende todo o Jardim São Jorge. Também tinha fama de perdulário. Ostentava um padrão de vida elevadíssimo, gastava muito dinheiro com a própria vaidade, amigos e mulheres em ambientes como a Boate da Cigana.

“Tal extravagância o levou a decadência. Depois de um tempo, começou a vender suas terras”, salientou Alcides Loureiro. Em 1964, às raias da falência, Telmo Ribeiro fixou residência em Maringá. Três anos mais tarde, viajou até Cornélio Procópio, no Norte Pioneiro, para cobrar um devedor e levou um tiro no peito.

O capitão influente e de muitos amigos, conhecido como rápido no gatilho, e que um dia participou da Guerra Paulista, enfrentou grileiros e jagunços, foi surpreendido e morreu no próprio local, longe de casa e sozinho, sem tempo de ao menos tirar a arma do coldre.

Curiosidade

Pioneiros contam que na época da colonização diziam que Telmo Ribeiro ameaçou roubar uma das filhas do pioneiro Arthur de Melo. Para evitar o pior foi enviado reforço policial de Arapongas.

Frases dos pioneiros sobre o capitão Telmo Ribeiro

Carlos Faber

“Nunca vi ele bravo, estava sempre alegre. Embora falassem certas coisas dele, nunca vi nada. O Telmo sempre me oferecia ajuda, mas nunca precisei.”

Raimundo Leite

“Ele me desacatou dentro da minha casa. E eu não morri porque não corri.”

Severino Colombelli

“O capitão Telmo era uma pessoa muito boa e de coração mole.”

Cincinato Cassiano Silva

“A parada era dura com o Capitão Telmo. Ele que expulsou os jagunços daqui. Para alguns ele era bom, mas pra outros não.”

Izabel Andreo Machado

“O capitão era pra nós uma pessoa muito boa.”

José Antonio Gonçalves

“Ele usava um chapéu grande e um lenço no pescoço. Era educadíssimo, mas a coisa com ele era meio brava.”

Valdomiro Carvalho

“Ele era realmente grande aqui. Eu ia com ele buscar boi no Mato Grosso, pra ganhar um dinheiro. Levava um mês. A gente ia pelo Porto São José, pegava um vaporzinho e atravessava a boiada de pouco em pouco.”

Paulo Tereziano de Barros

“O Capitão Telmo trouxe muita gente que ele achava que podia trabalhar no mato.”

José Francisco Siqueira (Zé Peão)

“Meu primeiro negócio com ele foi 30 sacas de arroz e 10 capados. Tudo fiado. Falavam que ele não pagava ninguém, tudo mentira. Depois de três dias, ele acertou comigo.”

Oscar Geronimo Leite

“Telmo Ribeiro era um dos mandões da época.”

José Ferreira de Araújo (Palhacinho)

“O telmo jogava snooker com a gente, andava com nós.”

José Alves de Oliveira

“Ele foi um dos grandes fregueses do meu bar. Nunca me deu um único prejuízo. Ia lá, comprava e pagava direitinho.”

Written by David Arioch

agosto 4, 2010 at 12:12 pm

Publicado em História, Paranavaí, Pioneirismo

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Grileiros tomavam conta da Brasileira

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Em 1935, o povoado era habitado apenas por pioneiros corajosos e posseiros

Intervenção federal na Brasileira só aconteceu em 1936 (Foto: Reprodução)

Na década de 1930, quando a Fazenda Brasileira, atual Paranavaí, no Noroeste do Paraná, foi abandonada por grande parte de seus habitantes, ficaram apenas os pioneiros mais corajosos e grileiros que logo começaram a tomar conta do povoado.

Em 1935, a Brasileira se dividia entre pioneiros que não queriam abrir mão do novo lar e grileiros que chegavam de todas as partes do país. Nenhum dos remanescentes se deixava intimidar, mesmo com a intervenção federal de Manoel Ribas. “Havia poucos colonos. Naquele tempo, tinha que ter muita coragem pra vir pra cá, então dá pra imaginar que quem se aventurava na Fazenda Brasileira estava sujeito a duas coisas: matar ou morrer”, relata o pioneiro cearense João Mariano.

Sede da Brasileira na década de 1930

Mesmo com poucos moradores no povoado, a briga por terras se acirrou. Posseiros trocavam ameaças sem se importar com os transeuntes, o que já dava a ideia de que algo muito ruim viria depois. Quando o Governo do Paraná decidiu intervir, dando prazo de 90 dias para os grileiros desocuparem as áreas invadidas, a situação já estava fora de controle. “Seria preciso muito mais que isso pra fazer esse pessoal desapropriar as terras”, destaca Mariano, acrescentando que chegou um momento em que ninguém mais trocava ameaças, simplesmente matava o seu desafeto.

À luz do dia, não era raro ouvir tiros vindo de várias direções. Cadáveres eram vistos em meio ao povoado, caídos sobre o solo arenoso. Dependendo da intensidade da corrente de ar, a terra cobria superficialmente o morto. Aqueles que não tinham familiares eram deixados onde estavam, abandonados sobre o chão, até começarem a se decompor. Apenas quando o odor da volatização de cadaverina e putrescina se tornava insuportável que alguém dava um jeito de se livrar do corpo.

“Mas a vida continuava. Afinal, quem tinha peito pra interferir?”, questiona o pioneiro, lembrando que quem quisesse viver na colônia tinha que lidar com a morte como se fosse algo natural e cotidiano. À época, acontecia do moribundo agonizar no chão enquanto suplicava por ajuda. Mesmo assim, as pessoas passavam ao lado ignorando sua presença.

Telmo Ribeiro chegou na Brasileira com um grupo de mercenários paraguaios

A ambição e a ganância em conseguir por meio da força um pouco dos 317 mil alqueires de terras da Fazenda Brasileira custou a vida de muita gente. Estima-se que dezenas de pessoas foram assassinadas nesse período, embora seja impossível precisar o total de vítimas. Muitos crimes eram ocultados pelos jagunços que se livravam dos cadáveres nas imediações do Porto São José, na Lagoa do Jacaré, confluente do Rio Paraná. “Os corpos eram despejados lá porque os jacarés comiam a carne humana, eliminando as provas do crime”, garante o pioneiro mineiro Sátiro Dias de Melo.

Em 1936, quando a Brasileira começou a ganhar fama em todo o Paraná pela onda de crimes, o governo federal pressionou o interventor Manoel Ribas que enviou para cá o tenente gaúcho Telmo Ribeiro, famoso por métodos menos ortodoxos de impor ordem. Com o tenente, conhecido como rápido no gatilho, veio um grupo de mercenários paraguaios de Pedro Juan Caballero. Não levaram mais do que alguns meses para dar fim ao clima de faroeste que imperava no povoado. Segundo pioneiros, melhoraram a situação ao preço de muitas mortes.